Victor Hugo |
Quando o obscurantismo da fé dominava as
mentes, levando-as ao fanatismo desestruturador da dignidade e do
comportamento; quando a cultura, enlouquecida pelas suas conquistas no campo da
ciência de laboratório, proclamava a desnecessidade de qualquer preocupação com
Deus e com a alma, face à fragilidade com que se apresentavam no proscênio do
mundo; quando a filosofia divagava pelas múltiplas escolas do pensamento, cada
qual mais arrebatadora e irresponsável, inculcando-se como portadora da verdade
que liberta o ser humano de todos os atavismos e limitações; quando a arte
rompia as ligações com o clássico, o romântico e a beleza convencional, para
expressar-se em formulações modernistas, impressionistas, abstracionistas,
traduzindo, ora a angústia da sua geração remanescente dos atavismos e
limitações do passado, ora a ansiedade por diferentes paradigmas de afirmação
da realidade; quando se tornavam necessários diversos comportamentos sociais e
políticos para amenizar a desgraça moral e econômica que avassalava a
Humanidade; quando a religião perdia o controle sobre as consciências e tentava
rearticular-se para prosseguir com os métodos medievais ultramontanos e
insuportáveis; quando as luzes e as sombras se alternavam na civilização,
surgiu o Espiritismo com a sua razão de ser para promover o homem e a mulher, a
vida e a imortalidade, o amor e o bem a níveis dantes jamais alcançados.
Realizando uma revolução silenciosa como
poucas jamais ocorridas na História, tornou-se poderosa alavanca para o
soerguimento do ser humano, retirando-o do caos do materialismo a que se
arrojara ou fora atirado sem a menor consideração, para que adquirisse a
dignidade ética e cultural, fundamentada na identificação dos valores morais,
indispensável para a identificação dos objetivos essenciais e insuperáveis da
paz interna e da consciência de si mesmo durante o trânsito corporal.
Logo depois, no Collège de France,
proclamando ser Jesus um homem incomparável, no seu memorável discurso, o
acadêmico e imortal Ernesto Renan confirmava, a seu turno, embora sem qualquer
contato com a Doutrina nascente, a humanidade do Rabi galileu, rompendo a
tradição dogmática do Homem Deus ou do ancestral Deus feito homem.
Sob a ação do escopro inexorável das
informações de além-túmulo, o decantado repouso ou punição eterna, o arbitrário
julgamento mais punitivo que justiceiro, cediam lugar à consciência da vida
exuberante que prossegue morte afora impondo a cada qual a responsabilidade
pela conduta mantida durante a trajetória encerrada.
As narrações da sobrevivência tocadas pela
legitimidade dos fatos fundamentadas na lógica da indestrutibilidade do ser
espiritual, davam colorido diferente às paisagens da Eternidade, diluindo as
fantasias e mitos que as adornaram por diversos milênios.
Permitiu que o ser humano se redescobrisse
como Espírito imortal que é, preexistente ao berço e sobrevivente ao túmulo,
facultando-lhe compreender a finalidade existencial, que é imergir no oceano do
inconsciente, onde dormem os atos pretéritos e as construções que projetam
diretrizes para o momento e o futuro, a fim de diluir as volumosas barreiras de
sombra e de crueldade a que se entregou e que lhe obnubila a compreensão da sua
realidade, emergindo em triunfo, para que lobrigue a imarcescível luz da
verdade que o há de conduzir pelos infinitos roteiros do porvir.
Intoxicado pelos vapores da organização
fisiológica, mergulhado em sombras que lhe impedem o discernimento, vagando
pelos dédalos intérminos da busca da realidade, somente ao preço da fé
raciocinada e lógica, portadora dos instrumentos que se derivam dos fatos
constatados, o homem e a mulher podem avançar com destemor pelas trilhas dos
sofrimentos inevitáveis, que são inerentes à sua condição de humanidade,
vislumbrando níveis mais nobres que devem ser conquistados.
O Espiritismo traçou novos programas para a
compreensão da vida e a mais eficaz maneira de enfrentá-la, desafiando o
materialismo no seu reduto e os materialistas no seu cepticismo,
oferecendo-lhes mais seguras propostas de comportamento para a felicidade ante
as vicissitudes do processo existencial.
Não se compadecendo da presunção dos vazios
de sentimento e soberbos de conhecimentos em ebulição de idéias, demonstrou a
sua força arrastando desesperados que foram confortados, violentos que se
acalmaram, alucinados que recuperaram a razão, delinqüentes que volveram ao
culto do dever, perversos que se transformaram, ateus que fizeram as pazes com
Deus, ingratos que se reabilitaram perante os seus benfeitores, miseráveis
morais que se enriqueceram de esperança e de alegria de viver, construindo
juntos o mundo de bem-estar por todos anelado.
O Espiritismo trouxe a perfeita mensagem da
justiça divina, por enquanto mal traduzida pela consciência humana,
contribuindo para a transformação da sociedade, mas sem a revolução sangrenta
das paixões em predomínio, que sempre impõe uma classe poderosa sobre as outras
que são debilitadas à medida que vão sendo extorquidos os seus parcos recursos
até a exaustão das suas forças, quando novas revoluções do mesmo gênero explodem,
produzindo desgraça e ódios que nunca terminam...
Trabalhando a transformação moral do
indivíduo, propõe-lhe o comportamento solidário e fraternal, a aplicação da
justiça corretiva e reeducativa quando delinqüi, conscientizando-o de que as
suas ações serão também os seus juízes e que não fugirá de si mesmo onde quer
que vá.
Todo esse contributo moral foi retirado do
Evangelho de Jesus, especialmente do Seu Sermão da montanha, no qual reformulou
os valores humanos até então aceitos, demonstrando que forte não é o vencedor
de fora, mas aquele que se vence a si mesmo, e poderoso, no seu sentido
profundo, não é aquele que mata corpos, mas não é capaz de evitar a própria
morte.
Revolucionando o pensamento ético e abrindo
espaço para novo comportamento filosófico, a Sua palavra vibrante e a Sua
vivência inigualável, colocaram as pedras básicas para o Espiritismo no futuro
alicerçar, conforme ocorreu, os seus postulados morais através da ética do amor
sob qualquer ponto de vista considerado.
Nos acampamentos de lutas que se estabeleciam
no Século XIX, quando a ciência e a razão enfrentavam a fé cega e a prepotência
das Academias e dos seus membros fascinados como Narciso por si mesmo, o
Espiritismo surgiu como débil claridade na noite das ambições perturbadoras e lentamente
se afirmou como amanhecer de um novo dia para a Humanidade já cansada de
aberrações de conduta como fugas da realidade e sonhos de poder transitório,
transformados em pesadelos de guerras infames, cujas seqüelas ainda se demoram
trucidando vidas e dilacerando sentimentos.
A razão de ser do Espiritismo encontra-se na
sua estrutura doutrinária, diversificada nos seus aspectos de investigação
científica ao lado das demais correntes da ciência, do comportamento filosófico
com a sua escola otimista e realista para o enfrentamento do ser consigo mesmo
e da vivência ético-moral-religiosa que se estrutura em Deus, na imortalidade,
na justiça divina, na oração, na ação do bem e sobretudo do amor, única
psicoterapia preventiva-curativa à disposição da Humanidade atual e do futuro.
Autor: Espírito Victor Hugo Médium: Divaldo
Pereira Franco Página psicografada no dia 7 de junho de 2001, em Paris, França.
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