Richard Simonetti
O medo de ser enterrado vivo induz muita gente a cogitar da própria cremação. Queima-se o cadáver evitando o problema. Mas há uma dúvida que inspira a pergunta mais frequente nas palestras sobre a morte:
Nessas oportunidades, costumo dizer:
− Bem, no interior do forno a temperatura atinge mil e quatrocentos graus
centígrados. Considerando que a água ferve a cem graus, podemos imaginar o que
é isso. Fica tão quente que o próprio cadáver entra em combustão. Então, em
meio às labaredas, se o falecido estiver imbuído de concepções teológicas
medievais, imaginará, horrorizado: “Meu Deus! Estou no inferno!”
Trata-se, evidentemente, de uma brincadeira para descontrair os presentes, ante
tema tão fúnebre. Qualquer pessoa esclarecida, de qualquer religião, sabe que o
Inferno de fogo, onde as almas ardem, em tormentos eternos, sem se consumirem,
é uma fantasia desenvolvida em tempos recuados, quando os princípios religiosos
se impunham muito mais pelo medo do que pela lógica. Sabemos hoje que Céu ou
Inferno não são locais geográficos. Existem na intimidade de cada um, em
decorrência de nossas ações.
Objetivamente poderíamos responder à pergunta informando que se o Espírito
estiver ligado ao corpo não sofrerá dores, porque o cadáver não transmite
sensações ao Espírito, mas obviamente experimentará impressões extremamente
desagradáveis, além do trauma decorrente de um desligamento violento e extemporâneo.
Oportuno destacar algumas considerações de Emmanuel, no livro O Consolador,
psicografia de Francisco Cândido Xavier:
“Na cremação, faz-se mister exercer a piedade com os cadáveres, procrastinando
por mais horas o ato de destruição das vísceras materiais, pois, de certo modo,
existem sempre muitos ecos de sensibilidade entre o Espírito desencarnado e o
corpo, onde se extinguiu o “tônus vital”, nas primeiras horas sequentes ao
desenlace, em vista dos fluidos orgânicos que ainda solicitam a alma para as
sensações da existência material.”
O próprio Chico, em entrevista na extinta televisão Tupi, em 1971, transmite
nova informação de Emmanuel: “Deve-se esperar pelo menos setenta e duas horas
para a cremação, tempo suficiente para o desligamento, ressalvadas as exceções
envolvendo suicidas ou pessoas muito presas aos vícios e aos interesses
humanos”.
Nos fornos crematórios de São Paulo, espera-se o prazo legal de vinte e quatro
horas. Não obstante, o regulamento permite que o cadáver permaneça em câmara
frigorífica pelo tempo que a família desejar. Espíritas costumam pedir três
dias. Há quem peça sete dias.
Importante reconhecer, todavia, que muito mais importante do que semelhantes
cuidados seria cultivarmos uma existência equilibrada, marcada pelo esforço de
renovação e de prática do Bem, a fim de que, em qualquer circunstância de nossa
morte, libertemo-nos prontamente, sem traumas, sem preocupação com o destino de
nosso corpo.
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